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Brainstorming 2.0

Um blog que é basicamente um consultório de um psicólogo onde se fala de tudo sem restrições ou medos.

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Um blog que é basicamente um consultório de um psicólogo onde se fala de tudo sem restrições ou medos.

O não desconfinamento

   Assisti a um webinário com o bastonário da Ordem dos Médicos e com o bastonário da Ordem dos Psicólogos. O primeiro referiu que Portugal confinou bem mas desconfinou mal; o segundo explicou que em parte isso se deve ao facto de no confinamento ser necessário passar apenas uma mensagem para toda a gente - ficar em casa - mas no desconfinamento era preciso passar várias mensagens direccionadas para públicos-alvo específicos e isso não aconteceu.

   Eu concordo. Aliás, sinto que faço parte de um público-alvo que, de certa forma, foi esquecido durante este período de desconfinamento: aqueles que ainda não desconfinaram. Quando o desconfinamento começou a preocupação foi comunicar com quem se encontrava a trabalhar/ia regressar ao trabalho, o que é compreensível. Depois existem aquelas mensagens gerais para toda a população, como usar máscara nos sítios públicos, lavar as mãos frequentemente, manter o distanciamento social... que me são úteis considerando as poucas vezes que saio de casa.

   Mas e aqueles que ainda se mantêm sobretudo em casa? Temos o exemplo dos idosos, principalmente os que frequentavam centros de dia que ainda permanecem fechados sem previsão de abertura. E depois temos o exemplo de quem ficou desempregado, como é o meu caso. Se em alturas ditas normais é um momento difícil, agora ainda é mais. Confinei em meados de Março, em Abril fui colocada em lay-off que durou até Junho e em Julho terminou o meu contrato, pelo que fui mandada embora. Não pude procurar emprego antes porque além da maioria dos processos de recrutamento terem cessado, tinha uma cláusula no contrato de trabalho que me obrigava a indemnizar a empresa caso rescindisse contrato e não desse um aviso prévio de dois meses, o que é quase impossível.

    Quando comecei a procurar trabalho há dois meses atrás, os processos de recrutamento estavam diferentes, muitos são feitos por vídeochamada (o que implica que se perca parte da relação que se estabelece com o recrutador e não se consegue sentir o ambiente da empresa), as que são presenciais requerem uma panóplia de procedimentos de segurança (sendo que alguns nem são cumpridos, cheguei a ter entrevistas com pessoas sem máscara, já eu decidi usar a minha o tempo todo). Também as burocracias estão diferentes, se antes era massacrante ter de ir ao Centro de Emprego e à Segurança Social e ficar à espera, agora é ainda pior ter de marcar online e às vezes ter de esperar semanas até ter vaga. 

   A maior parte das pessoas diz que é difícil lidar com todas estas mudanças e tentar regressar à "normalidade", sendo que o mundo como o conhecíamos antes deixou de existir, e acredito que seja difícil. Para mim também é difícil, de outro ponto de vista, é difícil lidar com todas as mudanças num curto espaço de tempo, aceitar que a minha "normalidade" nunca vai voltar porque a minha vida profissional deu uma volta gigante e ficou virada do avesso, estar em paz com o facto de poder ser necessário dar um passo atrás e voltar para casa dos meus pais para poder estabilizar as coisas e depois então dar dois passos em frente. 

   Acredito sinceramente que foi difícil para aqueles que continuaram a ter de trabalhar durante a quarentena e para quem teve de desconfinar e regressar ao mundo do trabalho. Mas preferia mil vezes isso a ter de estar confinada em casa por estar desempregada.

Imagem retirada do site Technologyreview.com